Ao pensar na relação
gramática-literatura, a primeira coisa que me vem à mente é a minha própria
experiência: quando adolescente, eu amava a literatura, mas detestava a
gramática. Lembro-me bem de uma ocasião em que a professora tentava explicar a
diferença entre as subordinadas causais e as coordenadas explicativas, e tudo o
que eu mais queria naquela hora era transformar-me em um pastor de ovelhas, em um ermitão ou em coisa que o valha. Em outras palavras, o que eu mais queria era fugir
de tudo aquilo. Minha postura era totalmente arrogante em relação à gramática e
à redação, eu gostava de frases de efeito do tipo “metamos o martelo nas teorias...”,
do escritor francês Vitor Hugo. Mal sabia eu que o caráter revolucionário do
Romantismo defendia a liberdade de criação e de expressão, o fim dos padrões estéticos e não o fim da gramática!
Eu só conseguia me
concentrar no martelo quebrando tudo, não prestava atenção ao restante da frase:
“Metamos o martelo nas teorias, nas
poéticas e nos sistemas. Abaixo este velho reboco que mascara a fachada da
arte! Não há regras nem modelos além das leis da natureza, que planam sobre
toda a arte, e das leis especiais que, para cada composição, derivam das
condições próprias de cada assunto". Eu não conseguia enxergar a precisão gramatical por tras daquela frase, que permitia que o autor se expressasse com
clareza e perfeição.
Por outro lado, um dos
meus passatempos favoritos era ler e reler os contos do escritor britânico
Oscar Wilde, que se destaca pelo extremo gosto pela beleza. O autor da época
vitoriana pertenceu ao realismo e se identificou especificamente com o
esteticismo inglês, movimento artístico baseado na doutrina de que a arte
existe para benefício de sua exclusiva beleza e que esta deve ser elevada acima
da moral e dos temas sociais na literatura.
Parece contraditório,
não?
Anos mais tarde, após
estudar letras e ter a oportunidade de trabalhar como professora de língua
portuguesa e literatura, pude entender que a escrita, principalmente a
literária, não é um dom inato, uma dádiva que o autor invoca como um xamã. Entendi
que a estética literária é fruto, sim — em parte —, da criatividade e da
inspiração, mas também de muito trabalho e reflexão e, que, ao contrário do que
eu imaginava, a gramatica não é um instrumento de opressão e tortura, mas um
meio que nos permite acessar e manifestar o belo.
Hoje, passados mais de
dez anos de dedicação exclusiva à tradução, a minha relação com a gramática é
de gratidão e admiração. Quando falo de gramática, não me refiro a uma visão meramente
prescritiva e normativa, mas às associações conceituais, à estilística e às funções exercidas
por cada elemento que compõe esse sistema vivo e pulsante chamado língua. Uma boa estratégia para ensinar gramática é ensiná-la contextualizada por meio da literatura, para mostrar que aquela não é um reboco que engessa e tolhe a arte, mas sim o contrário: o acabamento que enfatiza sua beleza e forma.
Em certa ocasião, já na faculdade, na aula de Teoria da Literatura, o professor falava sobre o movimento literário do Romantismo, e eu fiz um comentário sobre a sua relação com a Revolução Francesa. O professor me constrangeu diante da turma dizendo que assim eu estava "matando" a literatura, que se eu me interessava por História deveria procurar outro curso... Como se os escritores fossem seres alheios à realidade e à sociedade... Por que tratar a literatura como algo sagrado acima do bem e do mal, acima do próprio homem? "A literatura é. E ponto" essa era a definição de literatura defendida pelo tal professor. Desculpem o desabafo.
Em certa ocasião, já na faculdade, na aula de Teoria da Literatura, o professor falava sobre o movimento literário do Romantismo, e eu fiz um comentário sobre a sua relação com a Revolução Francesa. O professor me constrangeu diante da turma dizendo que assim eu estava "matando" a literatura, que se eu me interessava por História deveria procurar outro curso... Como se os escritores fossem seres alheios à realidade e à sociedade... Por que tratar a literatura como algo sagrado acima do bem e do mal, acima do próprio homem? "A literatura é. E ponto" essa era a definição de literatura defendida pelo tal professor. Desculpem o desabafo.
educador.brasilescola.uol.com.br |
Adorei seu artigo, Madrinha. Bença! Beijão!
ResponderExcluir[Seu madruga, piscando e com a mão na garganta, engole em seco]
ExcluirObrigada e que Deus te abençoe!