terça-feira, 5 de julho de 2016

Palavras ou imagens?

Filme "Palavras e Imagens" (Words and Pictures)
"Vale um homem mais do que sua palavra, e uma mulher mais do que sua imagem?" 

Gostaria de recomendar este filme aos leitores do blog, porque propõe um interessante debate sobre o que vale mais: a palavra ou a imagem. Além disso, a história tem como pano de fundo o ambiente escolar e um romance conflitante entre um professor de literatura, Jack Markus (Clive Owen), e uma professora de artes, Dina Delsanto (Juliette Binoche).

Primeiramente, vale dizer que gosto dos filmes de escola (A sociedade dos Poetas Mortos; Escritores da Liberdade; O Sorriso de Monalisa; O clube do Imperador; Como Estrelas na Terra – Taare Zameen Par; Meu Mestre, Minha Vida; Mentes Perigosas, El Estudiante, La Lengua de las Mariposas, etc.) porque já fui professora e também já fui aluna, e considero o ambiente escolar extremamente desafiador e fascinante; a forma como as relações sociais se desenvolvem, a interação entre professores e alunos, o choque de gerações. O desafio de ganhar a confiança da turma e de estabelecer uma relação de parceria e cumplicidade e de conseguir atrair a atenção e o interesse do aluno. As ilusões e as frustrações; enfim, essa relação conflituosa entre professores e alunos próxima à relação entre pais e filhos. Mas vamos ao filme...

Jack Markus é um charmoso e eloquente professor de Língua e Literatura. Quando ainda era muito jovem, publicou um livro que foi muito bem recebido pela crítica e que lhe garantiu a contratação pela escola. Depois disso, não conseguiu publicar mais nada, seu casamento fracassou e tem uma relação conturbada e distante com o filho. Apesar de sua inteligência, age como um idiota e entrega-se ao vício do álcool e a uma patética autodestruição e autocompaixão, que o levam a cometer sucessivos desastres.

Dina Delsanto, por sua vez, é a nova conquista da escola, uma atraente e envolvente professora de artes, famosa pintora que enfrenta um drama pessoal: uma doença que limita progressivamente seus movimentos, e que lhe causa muita dor e sofrimento, pois a impede de fazer aquilo de que ela mais gosta — pintar. Dina é muito exigente, não tem complacência ao analisar o trabalho de seus alunos, ela busca incessantemente a perfeição.  

Após inúmeras saias-justas devidas à adição do professor de Língua e Literatura ao álcool, o diretor o chama para uma conversa e lhe comunica que o conselho, por motivos de economia, deseja fechar a revista literária editada pelo professor. Numa tentativa de salvar a revista e o emprego, Jack Markus propõe que a revista promova um embate “Palavras e Imagens” onde ele desafiará Dina Delsanto e cada um advogará a favor de sua arte.

Está dada a largada para um intenso e apaixonado debate entre o escritor que não consegue escrever e a pintora que não consegue pintar, debate apimentado pelo estranhamento à primeira vista que aos poucos se transforma em atração e admiração.

O ponto alto do filme é esse eterna tendência humana à polarização, à comparação; a contrastar e a opor diametralmente coisas da mesma natureza que se complementam, concentrando-se na divergência, reduzindo tudo a uma visão preconceituosa e superficial das coisas, à mera medição de forças.

É possível sintetizar uma obra como Dom Quixote numa única tela ou é possível alcançar o mesmo efeito e a mesma emoção estética do quadro expressionista O Grito descrevendo-o com mil palavras?

Esse é o xis do filme. Tanto a palavra quanto a imagem já renderam diversos adágios e provérbios ao longo dos tempos:

"Uma imagem vale mais que mil palavras". "Em terra de cego quem tem um olho é rei". "É preciso ver para acreditar". "Para bom entendedor, meia palavra basta". "Palavras, leva-as o vento". "As palavras têm a leveza do vento e a força da tempestade" (Victor Hugo). "E uma vez lançada, a palavra voa irrevogável" (Horácio). "Nenhum espelho reflete melhor a imagem do homem do que suas palavras" (Juan Vives). "La pluma es la lengua del alma; cuales fueren los conceptos que en ella se engendraron, tales serán sus escritos" (Miguel de Cervantes).

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus...” (João 1:1).

Deixo aqui três produções artísticas sobre o tema do retirante nordestino: um fragmento do texto “Morte e Vida Severina” obra-prima de João Cabral de Melo Neto; "Os retirantes" (1944), tela de Cândido Portinari; e por fim, uma produção audiovisual de “Morte e Vida Severina”, adaptada para os quadrinhos pelo cartunista Miguel Falcão. Preservando o texto original, a animação 3D dá vida e movimento aos personagens deste auto de natal pernambucano, publicado originalmente em 1956.

São necessárias palavras para descrever o quadro de Cândido Portinari? 

São necessárias imagens para ilustrar o poema de João Cabral de Melo Neto? 

E quanto à animação audiovisual do cartunista Miguel Falcão, alcançaríamos o mesmo efeito somente com o vídeo ou somente com o áudio?








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