Em espanhol, temos o pronome indefinido “uno”, assim como em
alemão temos o “man”. Esse pronome transmite a ideia de uma
identidade indeterminada que inclui o locutor, ou seja, equivale a “nós”, ou à
expressão coloquial “a gente” em português.
No português medieval, havia a forma “homem”. Said Ali
(1921:122) compara “a gente” com essa forma arcaica, salientando que ambos os
pronomes se formaram a partir de substantivos, assumindo esse estatuto
pronominal devido ao seu uso de agente "vago" e
"indeterminado". Acrescenta que: "A gente é usado principalmente
na linguagem familiar da atualidade".
Carlos Nougué, na Suma Gramatical da Língua Portuguesa,
afirma que, em português, o “um” com papel de indeterminador do sujeito sempre
foi de uso restrito, e, se se encontra algo abundantemente no Padre Manuel
Bernardes (em especial na Nova Floresta), aí está, ao que parece, na
qualidade de estrangeirismo (talvez o uno
do espanhol).
“Quanto um é mais pobre, tanto tem menos parentes” (P.
Manuel Bernardes)
Na frase de Bernardes, um está em lugar do medieval homem
ou do se chamado “indeterminador do sujeito”.
Em espanhol, o pronome indefinido uno é perfeitamente formal. Pode
usar-se com referência ao eu que fala. Nesse caso, é normal estabelecer a
concordância de gênero com a pessoa falante. Assim, se o falante for homem: “Uno
ya no sabe en qué crer”, e se for
mulher: “Una ya no sabe en qué crer”.
Se a mulher que fala não faz alusão a si mesma, mas ao ser humano em geral, poderá usar o indefinido uno. “En la situación actual, a uno no le queda otro remedio que resignarse”. O pronome reflexivo correspondente é “sí” “Es fácil si uno está seguro de sí
mismo” (Pombo, Metro); “Pero
uno, a pesar de sí mismo, insiste en hablar con frases cada vez más
pretenciosas» (Donoso, Elefantes).
Também atua como elemento reflexivo em orações impessoais: “Convencerse
de que morir no es después de todo tan jodido si se muere bien, si se muere sin
recelos contra uno mismo” (Benedetti, Primavera). Nesse tipo
de orações é preferível não empregar o pronome reflexivo “sí”, pois
este requer um referente específico.
Mais exemplos
El mayor peligro de engañar
a los demás está en que uno acaba inevitablemente, por
engañarse a sí mismo = O maior perigo de enganar aos
outros é que acabamos inevitavelmente, enganando a nós mesmos.
Considero más valiente
al que conquista sus deseos que al que conquista a sus enemigos, ya que la
victoria más dura es la victoria sobre uno
mismo. (Aristóteles) = Considero mais corajoso aquele que conquista seus desejos do que aquele
que conquista seus inimigos, pois a vitória mais difícil é a vitória sobre si mesmo.
Cosas que uno debe saber = Coisas que devemos
saber/Coisas que a gente deve saber.
Uno nunca sabe qué
esperar del futuro = Nós nunca sabemos o que esperar do futuro/A gente
nunca sabe o que esperar do futuro.
Referências:
Diccionario panhispánico de dudas de la RAE.
Suma Gramatical da Língua Portuguesa, de Carlos Nougué.
Gramática Comparada de a gente: variação no
Português Europeu, dissertação de mestrado de Sandra Maria de Brito Pereira.
Excelente mi gran maestra en la maestría de la enseñanza castellana.
ResponderExcluir