Acabei de ler o livro La
invención de Morel, do argentino Adolfo Bioy Casares, do qual ainda não
havia lido nada e fiquei muito impressionada.
É uma pena que a leitura não seja
um hábito no Brasil, além do pouco valor dado à literatura nacional, também não
estudamos a literatura hispano-americana, tão rica, com autores que conseguiram
consagrar-se do outro lado do oceano, mas que não conseguem um espaço no
vizinho lusófono. Não creio que o problema seja a barreira idiomática, pois
temos ótimos tradutores. Acho que o problema é mesmo a falta de estímulo à
leitura e a visão da literatura como frivolidade.
É lamentável, porque há sensações que só conseguimos experimentar
através da leitura... Enfim, deixemos de lado as lamúrias e vamos direto ao
ponto.
Para começar, quero dizer que li o livro em formato eletrônico, no Kindle. Em
outra oportunidade pretendo falar da leitura eletrônica e de suas vantagens
para aqueles que ainda torcem o nariz, assim como eu o torcia.
Logo ao ler o prefácio, já me chamou a atenção a qualidade
do texto e da argumentação, não era um simples prefácio, era “o prefácio”. O
prefácio começa registrando o desabafo do escritor Stevenson, autor de “O Médico e o Monstro” (1886), que afirma
que o leitor inglês desdenha as peripécias e o romance de aventuras. A seguir,
o autor do prefácio refuta o escritor e filósofo, Ortega y Gasset, autor de “La
desumanización del arte” (1925); que defende a superioridade do romance
psicológico sobre o romance de aventuras, ao afirmar que hoje é muito difícil inventar
uma aventura capaz de despertar nossa sensibilidade superior e que o prazer das
aventuras seria inexistente ou pueril.
Após defender romance de aventuras, o autor do prefácio conclui
seu argumento com a seguinte afirmação “He discutido con su autor los pormenores de su trama, la he releido;
no me parece una imprecisión o una hipérbole calificarla de perfecta.”, Jorge Luis Borges.
Um prefácio de Jorge Luis Borges dizendo que a obra é perfeita
é mais do que suficiente para deixar qualquer leitor empolgado. De certa forma,
o prefácio de Borges está para o gênero novela ciência-ficção, assim como o Prefácio
de Cromwell (1827), de Vitor Hugo, está para o drama romântico. Comecei logo a
leitura com muita expectativa.
A história é narrada em primeira pessoa por um foragido da
justiça, condenado a prisão perpétua, que se diz inocente, vítima de um erro do
sistema judicial. Para escapar da condenação, o narrador foge num bote
rudimentar até uma ilha deserta, a qual teria sido infestada por uma estranha
doença que mata de fora para dentro, o que tornaria o local um refúgio
idôneo.
A parte alta da ilha possui umas construções abandonadas, imponentes
e misteriosas: um museu com uma biblioteca e um aquário, uma piscina e uma capela.
No sótão do museu há um sala misteriosa com paredes azuis e máquinas que ele
não sabe para que servem, também há uma bomba d´água e um gerador de energia, há
ainda uma construção subterrânea octogonal com câmaras simétricas que remetem a
um abrigo antibombas. A rotina na ilha é muito árdua, o protagonista precisa enfrentar
constantemente as marés, os animais, as doenças e cuidar da manutenção da bomba
e do gerador.
De repente, sua rotina é quebrada pela presença inusitada de
um grupo de veranistas que parecem estar ali a passeio. Eles se instalam na
parte alta da ilha, no museu. Isso dificulta sobremaneira a vida do fugitivo,
que acredita possa se tratar de uma conspiração para prendê-lo; assim, ele se
vê obrigado a ficar na parte baixa da ilha frequentemente é inundada pelas
marés e a alimentar-se de raízes e bulbos.
Desconfiado, o foragido faz incursões até o alto da ilha e
descobre uma mulher misteriosa, de aparência cigana, cujo nome é Faustine.
Todos os dias ela se senta no penhasco para observar o pôr do sol, enquanto ele a observa à distância. Esse ritual se repete dia após dia, e o
foragido acaba apaixonando-se pela misteriosa mulher. Essa paixão lhe desperta
a esperança, e ele passa a se arriscar tentando estabelecer contato, tentando
declarar seu amor, mas todas as tentativas são frustradas, pois ela parece
ignorá-lo deliberadamente, fingindo que não o vê.
Os misteriosos veranistas realizam atividades repetitivas e
monótonas, ouvem as mesmas músicas, repetem os mesmos gestos. Na tentativa de
aproximar-se de Faustine, o fugitivo tem alguns encontros abruptos com outros
membros do grupo, mas ninguém esboça reação alguma, eles parecem não vê-lo. Assim, ele chega a duvidar da existência desses visitantes, desconfiando de que sejam alucinações provocadas pelas ingestão dos bulbos e raízes. O prófugo não consegue entender essa
estranha situação e percebe que há um mistério a ser desvendado.
Até que chega o dia da grande revelação. Ele presencia às
escondidas uma reunião convocada pelo líder dos visitantes — o inventor Morel —, este faz uma surpreendente confissão ao restante do grupo: ele teria... tchan, tchan, tchan, tcháááán... você vai ter que ler para saber!
O nome da personagem "Morel" seria uma homenagem à obra de H. G. Wells, A Ilha do Doutour Moreau.
O nome da personagem "Morel" seria uma homenagem à obra de H. G. Wells, A Ilha do Doutour Moreau.
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