Após um período de muito trabalho, nada como umas férias!
Acabei de retornar de uma viagem de duas semanas à Espanha. A viagem foi ótima
e sinto que aos 41 anos estou ficando mocinha, pois viajei sozinha e não fiz
nenhuma trapalhada, não perdi meu passaporte nem desci na cidade errada, ou
seja, agora sou uma perita no assunto. Tanto, que desta vez, já fui preparada
com as moedinhas de 1 euro para pagar o carrinho das malas: matei a pau! Até
ensinei a alguns turistas desorientados como usar a maquininha das fichas.
“Prestem atenção, é muito simples...”.
Bom, como sempre, fui “cargada como una mula”, levei 10 pares de havaianas, 3 garrafas de
cachaça, limão (lá, nosso limão é
conhecido como “lima” e seu preço é bem salgado), ingredientes para feijoada,
incluindo a couve (que lá se chama berza e é mais difícil de encontrar
que piolho em careca), e as “extravagâncias” que minha irmã sempre me pede:
pipoca doce de canjica e halls de cereja, ela adora!
Ah, sim, como agora estamos morando em Belém do Pará levei
um quilo de polpa de cupuaçu, 4 vidros de doce de cupuaçu, e também artesanato,
cerâmica marajoara, três pratos para minhas tias e um vaso lindíssimo para
minha irmã. Para meu sobrinho de 9 anos, comprei umas lembrancinhas que
considerei exóticas, porque ele já tem o quarto cheio de brinquedos, então
comprei um pião de madeira e um sapo de madeira que reproduz o coaxar do bichinho.
O pião me deu muito trabalho, passei mais de uma semana treinando em casa,
dando cada trombada no chão do apartamento que os vizinhos de baixo devem ter pensado
que estávamos fazendo reformas. Encantei-me com o sapo manauara de madeira que
possui uma espécie de crista em suas costas, onde ao passar uma varinha também
de madeira, produz o som característico desses anfíbios.
Para criar um clima místico, falei como um xamã ao meu sobrinho: “Você está segurando um pedaço da selva amazônica em suas mãos, com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Minha irmã sussurrou em meu ouvido: “Não quero acabar com sua empolgação, mas nós tínhamos um sapo igual a esse, compramo-lo na Tailândia, não sei onde foi parar, mas acho que ele já não se lembra”. Que beleza! Na era “Made in China” é difícil encontrar algo original, mas o que vale é a intenção. Isso sem falar no constrangimento que passei quando fui comprar o sapo no mercado público Ver o Peso em Belém. Assim que vi o sapo, com toda minha ingenuidade, encostei na varinha de madeira e perguntei ao vendedor: “Moço, para que serve este pauzinho” e quando encostei no pauzinho, este caiu e rolou para debaixo de todas aquelas parafernálias exibidas na barraca. O moço fez uma carranca e eu fiquei morrendo de vergonha.
Sapo Manauara |
Cerâmica Marajoara no mercado público Ver o Peso, em Belém do Pará |
A recepção no aeroporto foi muito emocionante, porque um dos
motivos de minha viagem era conhecer minha sobrinha de quatro meses, então foi com
muita alegria que pude constatar pessoalmente o crescimento da família com essa
coisinha superfofa para carregar no colo e encher de mimos “Ô
coisinha tão bonitinha da titia”. Meu sobrinho de nove anos cresceu
muito, mas continua com a mesma carinha meiga!
Agora minha irmã e família estão morando em um “pueblo”
a 40 km de Madri, próximo à Sierra de Guadarrama, uma pequena
cidade muito agradável, calma, limpa e acolhedora. Acolhedora, exceto por uma
senhora idosa que, no almoço comunitário da cidade, quase teve chilique quando lhe
perguntamos se poderíamos compartilhar a mesa. Nunca vi tanta “simpatia”
reunida em um único corpo, deixou no chinelo a protagonista do filme O Exorcista,
coisa que não combina nem um pouco com a procissão religiosa que motivou o
almoço comunitário, mas tudo bem, mau humor é uma coisa que existe em todos os
lugares do planeta.
Fizemos vários passeios por lugares típicos de Madri: Puerta del Sol, Plaza Mayor, Fuente de
Cibeles, Gran Vía, Ayuntamiento, passeio pelo Parque Madrid Río — uma área de
recreação para caminhar, pedalar e passear, construído entre os anos de 2006 a
2011 nas duas margens do rio Manzanares,
sobre o traçado subterrâneo da rodovia M30, é um parque voltado para o lazer do
cidadão.
Dürüm |
Bom, agora vamos a algumas curiosidades culturais e
linguísticas. Quando passávamos pela Plaza Mayor vi numa loja um cartaz que
dizia: “Tenemos gamusinos”. Perguntei ao meu cunhado o que eram gamusinos
e ele me explicou que é um animalzinho imaginário que os caçadores experientes inventaram
para zombar dos principiantes, uma lenda urbana tal como quando dizem a um
motorista inexperiente que seu carro tem um problema “en la junta de la trócola”, uma peça
imaginária do veículo. Conclusão, assim como existem mal-humorados em todas as
partes do planeta também existem os gozadores. Eu fiquei um tanto contrariada
com aquilo, pois achei que colocar um cartaz dizendo “Tenemos gamusinos” era
propaganda enganosa e uma afronta aos direitos do consumidor, então minha irmã
resolveu perguntar o que eram os gamusinos e lhe disseram que eram
uns doces típicos.
Outra anedota, desta vez constrangedora para mim, foi quando
meu cunhado me perguntou se eu conhecia o Pablo Iglesias e eu, com toda minha
ingenuidade, respondi: Sim, é o filho de Julio Iglesias! E minha irmã e meu
cunhado caíram na gargalhada, pois Pablo Iglesias não é filho de Julio
Iglesias, mas professor universitário que se elegeu eurodeputado pelo partido
Podemos. Ele é fundador e líder do partido que surgiu após o movimento
conhecido como 15M ou movimento dos indignados que surgiu em 2011 na Plaza del
Sol em Madri. Bom, sem comentários... é claro que eu tentei disfarçar, dizendo
“vocês não tem senso de humor, é óbvio que eu estava brincando”. Na verdade eu
conhecia a figura, mas não a liguei ao nome... E como não poderia deixar de ser os gozadores da Internet já criaram um meme do Julio Iglesias, aproveitando-se da coincidência dos sobrenomes.
Outra curiosidade linguística que me chamou à atenção é que,
em espanhol, a palavra “amador” não é usada com o mesmo sentido que a usamos em
português, ou seja, para designar uma pessoa que se dedica a um ofício por
gosto ou curiosidade e não por profissão. Amador é aquele que ama algo ou
alguém, o amante. Aficionado ou Amateur é aquele que exerce uma
atividade por gosto ou curiosidade, o termo aficionado também é usado em
sentido pejorativo. O termo Amateur é um artigo novo, um avanço da 23ª edição
do dicionário da RAE, é um adjetivo proveniente do francês cuja definição é
“aficionado a algo com certo conhecimento da matéria de que se trata”.
Uma dificuldade para os lusofalantes tradutores de espanhol
ou para os hispanofalantes tradutores de português é a formação de palavras por
sufixação e prefixação, esse assunto merece uma publicação à parte, pois é habitual
a interferência entre ambas as línguas. Por exemplo, enquanto em português
dizemos “mimado”, “cardiologista”, “enfermagem”, “secura”, “aprofundar”; em
espanhol, diz-se “mimoso”, “cardiólogo”, “enfermería”, “sequedad”, “profundizar”, por citar alguns exemplos.
Aqueduto de Segovia |
Mas deixemos de lado as questões linguísticas e voltemos aos
passeios. Fizemos alguns passeios por cidades que são patrimônios históricos: Toledo e Segovia, sobre Toledo já falei aqui no blog e sobre Segovia falarei
em outra ocasião. Ambas são encantadoras e são programas que valem a pena,
tanto, que é a segunda vez que visito Toledo e espero que não seja a última.
Visitamos o “Castillo de Manzanares El Real”
também conhecido como “Castillo de los Mendonza”, um
pequeno castelo muito bem conservado ao pé da Sierra de Guadarrama do
qual pretendo falar em outro momento.
Mais uma vez minha querida titia contribuiu para o crescimento de minha biblioteca e presenteou-me com três belas obras: o Diccionario de Sinónimos y Antónimos de María Moliner; 70 Refranes para la Enseñanza del Español, de Inmaculada Penadés Martínez, Reme Penadés Martínez, Xiaojing He e Eugênia Olímpio de Oliveira Silva; e Los Refranes del Quijote y sus Traducciones em la Lengua Portuguesa de Carmen Mª Comino Fernández de Cañete. Cada qual merece uma resenha à parte.
Como podem ver, queridos leitores, a viagem contribuiu para aumentar
meu repertório de assuntos para o blog, agora basta organizar as ideias e
aprofundá-las. Viajar é sempre uma oportunidade para refrescar a mente, fazer
descobertas e analisar as coisas a partir de outra perspectiva.
Desta vez, não fui durante o verão espanhol, mas no início
do outono, o que me permitiu viver uma experiência diferente. Meus familiares
estavam todos trabalhando, com exceção de minha irmã que ainda está usufruindo de
sua licença maternidade. Então pude presenciar o estresse dos madrilenhos para
conseguir encontrar uma vaga de estacionamento ou para encarar os
engarrafamentos nos horários de pico.
Desta vez, não estávamos todos reunidos na praia, mas
espalhados por Madri e pelas cidades vizinhas, então a comida serviu para
promover deliciosas reuniões familiares. Um dia nos reunimos para comer barbacoa,
o churrasco espanhol com suas peculiaridades como os puerros y pimientos (alhos-porós e pimentões) assados, muito
gostosos, diga-se de passagem. Outro dia fui eu que preparei uma modesta
feijoada, regada a caipirinha. E para fechar com chave de ouro, minha titia
mestre-cuca, ofereceu uma merienda-cena digna
de um masterchef, aliás, a titia está
fazendo um curso de culinária masterchef,
assim, é possível imaginar nossa empolgação para tantos quitutes deliciosos,
tanto, que até acabamos nos esquecendo de tirar fotos da família reunida. Um
dos destaques foram os saquitos de morcilla con pasta filo,
mmmmm... delicados, crocantes e deliciosos!
Saquitos de morcilla con pasta filo |
Se uma de minhas titias contribuiu para meu crescimento profissional,
aumentando minha biblioteca, as outras duas titias contribuíram para meu
crescimento cultural, levando-me a Toledo e a Segóvia, minha irmãzinha e
família, estiveram sempre a meu lado, também, a pesar das dificuldades de
carregar todos os apetrechos necessários para sair com um bebê. Até minha vozinha, com suas dificuldades de
locomoção, acompanhou-nos sempre que possível. Isso não tem preço e fico muito
agradecida. O principal não foram os lugares visitados, mas a companhia. Espero
poder retornar em breve, desta vez com meu marido e nossos filhos!
Círio de Nazaré |
Me encantan tus crónicas de viaje! Son fieles recuerdos, me hacen revivir muchos momentos, además de hacerme reír y reír! ;)
ResponderExcluir¡Cómo me alegro de que te gusten!
ExcluirBesotes
Me alegro de que hayas traído el diccionario de sinónimos de María Moliner en la maleta. Veo por tu texto que ha sido un viaje intenso y disfrutado. Muchos saludos desde Cáceres de España.
ResponderExcluir¡Muchas gracias y saludos desde Brasil!
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