Salmer
Borges nasceu em Petrópolis, Rio de
Janeiro. Morou durante cerca de 12 anos em países falantes de espanhol,
principalmente, no Equador. Ao voltar ao Brasil, em 2005, estudou Letras na
Universidade Metodista de São Paulo, fez uma pós-graduação em Tradução e uma
pós-graduação em Interpretação Simultânea, na Universidade Gama Filho. É
tradutor e intérprete freelancer com 8 anos de experiência. Suas áreas de
especialização são: legendagem, tradução corporativa e interpretação simultânea.
Diana - Traduzir legendas fazia parte de seus planos?
Como foi que tudo começou?
Salmer - O
meu envolvimento com a tradução, como é o caso de muitos tradutores, ocorreu
após eu voltar ao Brasil depois de morar muitos anos no exterior, no meu caso,
em países falantes de língua espanhola. A primeira oportunidade de tradução
escrita que tive, em 2007, foi em tradução para legendas, quando conheci Bruno
Murtinho, da 4Estações, por ocasião dos Jogos Pan-americanos, evento em que
trabalhei como intérprete consecutivo; eu trabalhava com espanhol e ele com
inglês. Nesse mesmo ano, ele começou a me passar alguns trabalhos. O meu
processo de aprendizagem ocorreu na prática. Ele me enviou o manual de
legendagem da empresa e me dava muitas dicas sobre como traduzir para legendas.
Desde o começo, me senti muito atraído pelo mundo da legendagem, e me dediquei
muito para poder oferecer um bom trabalho de legendagem. Como costumo dizer nas
minhas aulas de pós-graduação em tradução na matéria Legendagem, "nunca vi
ninguém que tenha nascido com o dom da legendagem"; portanto, com estudo e
dedicação, todos podem desenvolver as habilidades necessárias para oferecer uma
tradução para legendas de acordo com as exigências do mercado.
Diana - Quais são as línguas que você traduz e há
quanto tempo é tradutor?
Salmer - Eu
traduzo do espanhol para o português e do português para o espanhol. Traduzo
profissionalmente há 8 anos.
Diana - Em sua opinião, quais são as principais
habilidades que um tradutor de legendas deve ter?
Salmer - Para
traduzir para legendas, em primeiro lugar, o tradutor deve ter um conhecimento
avançado de ambos os idiomas com os quais vai trabalhar. Além disso, uma
excelente compreensão auditiva, uma vez que, nem sempre, o tradutor terá um script ou lista de diálogos à sua
disposição. Por outro lado, precisa ter um grande domínio do idioma para o qual
traduz e ser muito versátil no que diz respeito às suas estruturas morfossintáticas
para ser capaz de lidar com problemas específicos da legendagem, oriundos,
basicamente, do fato de que o tradutor para legendas sempre está sujeito a duas
variáveis: tempo e espaço.
Diana - Quais foram os principais desafios no início
da carreira?
Salmer - Como
dizia acima, o tempo e o espaço, ou seja, quantos caracteres você pode usar em
função de determinado tempo de fala, são os principais desafios de qualquer
tradutor que começa a traduzir para legendas. Você traduz determinado trecho,
mas, se ficar longo demais em função do tempo disponível, terá que alterá-lo.
Este é o grande desafio, desenvolver a capacidade de passar a mesma mensagem de
várias formas, seja transformando uma oração desenvolvida em uma oração
reduzida, usando um sinônimo com menos caracteres, tirando o vocativo, transformando
locuções adverbiais em advérbios, etc. É preciso levar em conta que nem sempre
uma boa tradução é uma boa legenda. Você pode traduzir muito bem determinado
trecho, porém, se essa tradução não estiver dentro da relação de caracteres por
segundo padrão, que é de cerca de 12, não será uma boa legenda.
Diana - De que você mais gosta em seu trabalho?
Salmer - Como
trabalho muito para festivais de cinema, tenho acesso a filmes e documentários
que não entram no circuito comercial. Gosto muito de documentários, embora sejam
umas das traduções mais difíceis de fazer, e cinema latino-americano. Mesmo que
traduzir para legendas não seja aquele mar de rosas que muitos pensam, porque
acham que passamos a vida vendo filmes e ganhando dinheiro com isso, gosto
muito de trabalhar com a imagem. Em alguns casos, você se diverte; em outros,
se descabela; em tantos outros, xinga seu traduzido, mas é um trabalho de que
gosto muito.
Diana - E de que menos gosta?
Salmer - No
começo, odiava marcar, ou seja, após traduzir, definir os tempos de entrada e
saída das legendas na tela, algo que todo tradutor para legendas deve fazer, e
fazer bem, o que exige bastante prática até conseguir sincronizar bem todas as
legendas. A velocidade das falas e a sobreposição de falas são os eternos
obstáculos que o legendista ou legendador deve superar constantemente.
Diana - Porque os espectadores, de modo geral,
costumam implicar tanto com a tradução de legendas?
Salmer - Em
primeiro lugar, as legendas são feitas para quem não entende o idioma original.
Se você entende, não precisa de legendas. As legendas não são feitas para serem
comparadas com o original, e sim para que aquele que não entende o idioma
original possa entender a obra.
Porém,
muitas vezes, pessoas que entendem, ou acham que entendem, o idioma original da
obra audiovisual, comparam o áudio com as legendas, e identificam
"erros". Essa percepção pode se dever a vários fatores:
- Realmente é um erro de tradução, o que acredito que seja o menos comum.
- É padrão do canal. A personagem diz "hijo de puta", e a legenda diz "desgraçado". É impossível que isso seja um erro de tradução, e sim uma exigência do padrão. Alguns canais vetam o uso de palavrões, palavras que possam ofender determinado grupo de pessoas, etc.
- "A personagem diz uma coisa, e a legenda diz outra."
Para
mim, é o que mais costuma causar essa percepção de "erro". Os
tradutores para legendas, como dito acima, estão o tempo todo sujeitos ao tempo
e ao espaço; portanto, precisam, muitas vezes, sintetizar as orações, e isso
pode causar uma percepção de que a personagem diz uma coisa, e a legenda diz
outra. Não traduzimos palavras, e sim ideias. Se as palavras que usamos para
transmitir as ideias se equivalem, não se pode dizer que a legenda está
"errada". Não existe uma única tradução certa para uma legenda. É
possível encontrar varias traduções para um mesmo filme, com certeza, com
palavras e orações diferentes, mas, possivelmente, a maioria delas certas.
Diana - Qual foi o trabalho que você mais gostou de
fazer e por quê?
Salmer - Já
fiz muitos trabalhos de legendagem; portanto, não me lembro de todos os
trabalhos que fiz. No nosso trabalho diário, você faz uma tradução, a revisa,
manda e parte para outra. Às vezes, vejo um filme e digo: "acho que
legendei esse filme". Já aconteceu, inclusive, de procurar nos meus
arquivos para ver se traduzi ou não tal filme. Nota: um mesmo filme pode ter
muitas legendas diferentes. Eu já traduzi vários filmes de Almodóvar, que,
obviamente, em se tratando de filmes nos anos 1990, por exemplo, já têm
traduções, mas as legendas possuem direitos autorais, que, normalmente, o
tradutor cede à produtora quando entrega o filme. Portanto, se o canal que
quiser exibir um filme não possuir um arquivo de legendas para esse filme,
precisará pedir sua tradução.
Mas,
respondendo à pergunta, recentemente traduzi um filme de que sempre gostei, e
adorei que tenham me pedido para legendá-lo: "El Hijo de la Novia".
Esse filme é uma obra-prima do cinema argentino.
Diana - Como é sua rotina de trabalho, o seu dia a
dia?
Salmer - Como
trabalho em casa, assim como quase todos os tradutores, precisamos ter muita
disciplina, senão nunca terminaremos nosso trabalho! Costumo trabalhar cerca de
9 horas por dia. Tento não trabalhar mais do que isso para não virar um
"escravo" do trabalho. Acordo por volta das 7h40 e faço o que todo
mundo faz; depois, dou uma olhada nos e-mails. Se tiver alguma revisão para
fazer, procuro fazer logo cedo, com a cuca fresca. Trabalho até mais ou menos
12h45, depois almoço e tento deitar uns 20 minutos, dizem que isso é ótimo para
a saúde, e quem sou eu para contestar?! Depois
trabalho de 13h30, 13h45 até umas 19h, quando minha esposa chega, e tento não trabalhar
depois disso. Quase sempre consigo, mas isso só é possível se você trabalhar
com muita disciplina e constância durante o dia.
Diana - Quais são os seus passatempos quando não está
traduzindo?
Salmer - Eu
adoro fotografia, sempre que posso, dou uns cliques e leio sobre fotografia. Também
gosto de levar uma vida tranquila com minha mulher e meu cachorro. Minha esposa
adora cozinhar, então aproveitamos esses momentos para conversar e tomar um
vinho, enfim, desfrutar das coisas simples da vida. Fora isso, gosto muito de
viajar. Pelo menos uma vez por ano, tento tirar umas boas férias, o que acho
fundamental.
Diana - Lembra-se de alguma anedota ou gafe que possa
compartilhar?
Salmer - Eu
morei muitos anos, cerca de 12, em países falantes de espanhol. Durante esse
tempo, convivi essencialmente com o espanhol e praticamente só escrevia em
espanhol. Logo que voltei, comecei a traduzir para o português, e cometia
bastantes erros de ortografia com palavras similares ou iguais. Frequentemente,
escrevia "por tanto", "em fim" e palavras assim em
português. Então percebi que precisava estudar português, dediquei-me, e hoje
dá pro gasto! Aqui vai uma dica: muitas vezes, as pessoas começam a traduzir
porque falam um idioma estrangeiro, na maioria das vezes, porque moraram fora,
o que, muitas vezes, dependendo do tempo em que moram fora e como levam a vida
no exterior, se em contato ou não com seu idioma natal, faz com que você
"esqueça" um pouco o seu próprio idioma ou fique um pouco
"contaminado" pelo estrangeiro. Por tanto, ops, portanto, quem
pretende traduzir precisa conhecer muito o idioma de chegada, ou seja, para o
qual vai traduzir, e não só aquele que aprendeu durante os muitos anos em que
morou fora. E isso é muito comum.
Diana - O que ainda gostaria de fazer como tradutor?
Salmer
- Não faço só legendagem, também faço tradução "escrita" (legendagem
também é escrita, mas costumam chamá-la assim) para empresas, que também gosto
muito. Também faço interpretação simultânea, área em que ainda estou crescendo
no mercado. Nunca traduzi literatura, e me atrai bastante. Gostaria de ter essa
experiência no futuro, mas não agora. Talvez na velhice, quando não tiver mais
coordenação para marcar os filmes que traduzo ou não conseguir escutar o que
dizem!
Diana - Poderia deixar uma dica para os tradutores
principiantes que se interessem pela legendagem?
Salmer - Primeiro,
devem fazer um curso de legendagem. Há alguns no mercado. Depois, muita prática
e encher o saco das produtoras até conseguir fazer um teste, mas esteja
preparado.
Alguns filmes legendados
para o português:
Carancho, El Aura, Todo Sobre mi Madre, El Traspatio,
Elefante Blanco, Hidalgo, la Historia Jamás Contada, La Mala Educación, La
Nana, Las Caras del Diablo, Los Colores de la Montaña, Bolero de Noche, Cansada
de Besar Sapos, Música Nocturna, Nicotina, Sin Otoño, Sin Primavera, Solo Dios
Sabe, Mientras Duermes, Che, Tesis sobre un Homicidio, Caleuche, Kamchatka, Los
Ojos de Julia, Puerta de Hierro, Todos Tenemos un Plan, El Hijo de la Novia,
Las Montañas Invisibles, programa Sangue Latino, série Punta Escarlata, novela
La Reina del Sur, série Pablo Escobar, el Patrón del Mal.
Alguns filmes legendados para o espanhol:
De
Pernas para o Ar, Bruna Surfistinha, Julio Sumiu, A Busca, Dossiê Jango, Jorge
Mautner, o Filho do Holocausto, Amor, Plástico e Barulho, Duas Pátrias, Confissões
de Adolescente, Dois Amores, Primeiro Dia de Um Ano Qualquer, Tarja Branca,
Rock Brasília, Outro Olhar, SOS Mulheres ao Mar, documentário Noel Rosa, programa
Mobilização.
Hola Diana! Muy buen aporte la entrevista! Subtitulación es algo lo cual no tenía mucha información todavía, entonces para mí ha tenido su valor la información aquí presentada. Un saludo!
ResponderExcluirExcelente entrevista. Aprendi um pouco mais sobre legendagem, área que me atrai muito embora, como o Salmer tenha dito, não consiste em passar o tempo assistindo filmes. Deve ter uma dinâmica muito diferente da tradução escrita o que traz um equilibrio interessante ao cotidiano. Gracias, Diana.
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