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terça-feira, 27 de maio de 2014

Entrevista com a tradutora Sheila Gomes




Sheila Gomes é tradutora de inglês e português com 19 anos de experiência.  Também foi professora de EFL por 23 anos. Atualmente trabalha com localização de software, sites e jogos, e é administradora do Multitude, um site de webinars e consultoria para tradutores e intérpretes. É bacharel em Turismo com ênfase em Meio Ambiente, pós-graduada em Tradução de inglês para português e graduanda em Informática Biomédica na UFPR. Usuária e divulgadora do programa gratuito de tradução assistida OmegaT. Membro da ABRATES, ATA e IAPTI e representante regional da ABRATES no sul do Brasil.



Diana - Quais são as línguas que você traduz e há quanto tempo é tradutora?

Sheila – Sou tradutora de inglês e português há 19 anos.



Diana - Como surgiu a oportunidade de trabalhar numa empresa de TI e de que forma isso contribui em sua formação profissional?

Sheila – Eu ensinava inglês e uma amiga avisou sobre a abertura da vaga na empresa. Embora eu estivesse com uma carga de aulas muito pesada, pensei que trabalhar em outra atividade que complementasse a renda seria interessante e recompensador em termos de desenvolvimento profissional. E realmente foi uma oportunidade de grande aprendizado. Mesmo não compensando financeiramente na época, valeu pelos contatos e acabou sendo o pontapé inicial para buscar minha independência como tradutora profissional. Além de ter sido o lugar onde aprendi a usar a primeira CAT tool que conheci: o OmegaT, do qual ainda hoje sou usuária e divulgadora.



Diana - Quais são os conhecimentos e as qualidades que a tradução técnica requer?

Sheila – É preciso ter uma mente aberta a várias interpretações, pois o pensamento técnico segue uma lógica própria e quem produz conteúdo nesta área nem sempre tem um domínio de escrita no próprio idioma.



Diana – Quais são as principais dificuldades que você enfrentou para estabelecer seu próprio negócio?

Sheila – Com certeza foi tomar decisões sobre as melhores opções devido à imensa quantidade de informações disponíveis na Internet. Li vários livros, pesquisei sites de todos os tipos, buscando opções de design que oferecessem o máximo de informações aos visitantes, pois creio que os pontos primordiais em qualquer oferta de serviços são a clareza e disponibilidade de informações, além de atendimento rápido e disponível, dentro das possibilidades de uma empresa de uma pessoa só.



Diana – E que vantagens isso lhe trouxe?

Sheila – O contato com grandes profissionais, a organização e acompanhamento das apresentações, além de serem grandes fontes de conhecimento, acabaram gerando uma série de novas ideias e projetos profissionais, dentro e fora do site. É uma experiência incomparável e extremamente recompensadora, mesmo com as exigências de tempo e dedicação à manutenção do empreendimento.



Diana – Em que consiste a localização e em que se distingue da tradução propriamente dita?

Sheila – A localização difere da tradução principalmente em termos de: (1) elementos que a integram, pois não consiste apenas de palavras, mas muitas vezes de códigos de programação, variáveis e referências para adaptação do texto para a realidade do público leitor; (2) a conversão de unidades (métricas, monetárias, etc.), referências culturais, populares e factuais para a região (conhecida no meio como “locale”) e (3) restrições como limitação de caracteres devido às características próprias das plataformas de apresentação (computadores e outros dispositivos) ou de clientes específicos.



Diana – Como é o processo de localização de um jogo?

Sheila – Não há um processo único, mas de modo geral, o processo deveria iniciar já na programação do jogo, para que esta já seja executada levando em conta a internacionalização, tornando o software compatível com os diferentes formatos linguísticos dos idiomas para os quais o jogo será traduzido (uso de caracteres especiais, formatos numéricos). A localização em si pode ser feita no próprio estúdio que desenvolve o jogo. Porém muitas vezes fica a cargo de uma agência especializada. Essa agência, por sua vez, pode usar um quadro de tradutores internos ou contratar profissionais independentes. Além do tradutor, normalmente há pelo menos um gerente de projetos (PM), um revisor e um tester, e o trabalho pode ir e voltar entre eles, dependendo do processo adotado pela empresa responsável pelo projeto.



Diana – Na tradução técnica, o que pesa mais: o conhecimento especializado ou o conhecimento linguístico?

Sheila – Há que se ter um equilíbrio entre os dois tipos de conhecimento e, mais que confiança no conhecimento acumulado por estudo e experiência, uma boa dose de desconfiança em relação aos textos e como interpretá-los, pois muitas vezes o conhecimento linguístico de quem os produziu sofre interferências de jargão e a escrita pode ser considerada estruturalmente correta no meio em que circulam, mas não necessariamente expressar ideias com clareza. Outro fator que interfere são as traduções de traduções, não é raro recebermos textos que já foram traduzidos de outro idioma, e cada etapa e pessoas envolvidas a mais pode adicionar dificuldades extras.



Diana – Como surgiu a ideia de criar o grupo TIME (Tradutores e Intérpretes Multiplicando Experiências) e o Multitude (blog que oferece webinars e consultoria para tradutores e intérpretes)?

Sheila – O TIME surgiu a partir da conjunção de alguns fatores: o primeiro, a minha participação no grupo Tradutores / Intérpretes do Facebook. Como sou uma das moderadoras, acompanho diariamente as atividades do grupo e percebi que havia discussões recorrentes sobre temas comuns a todo e qualquer profissional iniciante e mesmo a vários veteranos que reavaliavam sua trajetória profissional. O segundo fator é que sou geek assumida e muito curiosa a respeito de novas tecnologias de comunicação on-line, estou sempre buscando novidades. O terceiro foi perceber que havia vários colegas que respondiam generosamente às perguntas repetidas, quantas vezes viessem. Então pensei em unir esses fatores e criar algo que ajudasse a responder às dúvidas dos membros do grupo e ao mesmo tempo propiciasse o encontro de iniciantes e veteranos, e assim nasceu o TIME e depois veio também o TIMEcast, o podcast do grupo. Sou formada em Turismo e além de estar acostumada a organizar atividades e encontros, é um grande prazer acompanhar as atividades, aprendi e aprendo muito com os envolvidos, tanto com os palestrantes quanto com os participantes e suas perguntas que nos ajudam a ver as mesmas questões sob perspectivas diferentes.

Foi isso também que gerou a ideia do Multitude: oferecer webinars e consultoria a tradutores e intérpretes de modo mais abrangente, pois o TIME, além de ser restrito aos membros do grupo do FB, aborda temas mais gerais. O Multitude vai além e oferece temas voltados à especialização e profissionalização dos tradutores e intérpretes, com a oferta extra de ter os webinars gravados e acessíveis logo após cada apresentação, então os participantes podem rever os pontos que mais lhe chamem a atenção e quem não puder participar no horário e data marcados, pode comprar a gravação e assisti-la conforme sua conveniência. Além disso, acabo de fazer uma parceria com a Associação Brasileira de Tradutores (ABRATES) para oferecer ainda mais webinars e cursos com valores diferenciados para os membros e disponibilizados no mesmo molde: gravados e disponíveis logo após a apresentação. Outra iniciativa nascida no Multitude foi um blog com histórias de tradutores de todas as origens, idades e jornadas, com a intenção de ilustrar como é a grande a diversidade de caminhos nesse meio e inspirar e motivar iniciantes e veteranos que estejam (re)traçando sua carreira.



Diana – Como faz para conciliar tantas atividades?

Sheila – O meu lado geek ajuda bastante, pois uso vários recursos de software a hardware para me organizar, e tento estar on-line o máximo possível, algo que faço naturalmente, pois tenho uma curiosidade compulsiva por informação. E tenho as minhas prioridades bem claras: crescer sim, mas sempre junto com os meus pares, pois o que afeta a um, afeta a todos e cada posicionamento individual colabora para a manutenção e/ou elevação do nível da classe em geral, seja em termos de estabelecimento de padrões de mercado ou do status profissional perante a sociedade. O fato de trabalhar em casa e de ter o apoio da família também ajuda, e faço um esforço consciente de manter uma vida pessoal saudável, pois  este é um fator importante para manter o ritmo de trabalho e de vida.



Diana – Que conselho daria para alguém que pretende trabalhar como autônomo na área da tradução?

Sheila – Não há apenas um meio de construir uma carreira como tradutor autônomo, mas o fio comum que vejo na minha jornada e na de vários colegas é a busca de informações: ler blogs e livros de tradutores experientes, participar de grupos e fóruns on-line, participar dos encontros virtuais e presenciais, tudo isso ajuda o profissional a perceber a realidade do mercado de modo claro e quais são as melhores opções dentro do posicionamento que procura. Eu passei cerca de um ano apenas lendo e absorvendo informações de fontes variadas até decidir tornar-me tradutora em tempo integral e não me arrependo um segundo. Mesmo os percalços que invariavelmente acabamos encontrando têm um impacto menor quando estamos bem informados e os relacionamentos travados também nos ajudam tanto na vida profissional como pessoal.




Grupo de tradutores e intérpretes no Facebook: https://www.facebook.com/groups/tradutoreseinterpretes/



Página sobre o OmegaT: https://www.facebook.com/OmegaTBrasil

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