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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Ossos do ofício



Você sabe de onde surgiu a expressão “ossos do ofício”? 

Fiz uma rápida consulta ao “oráculo” e achei uma explicação que não me convenceu. Diz o ditado que “caiu na rede é peixe”, mas todos sabemos que se lançarmos a rede num rio, mar, lago ou piscina, poderemos retirar, facilmente, garrafas, sacolas, calçados, eletrodomésticos ou coisa que o valha, difícil mesmo será pegar um peixe.


Em se tratando de “rede virtual”, o buraco é mais embaixo. Há uma infinidade de informações e muitas delas não passam de mera especulação, cabe a nós ativar o “desconfiômetro” e filtrar os resultados.


O fato é que “dez em cada dez” artigos que encontrei sobre a origem de “ossos do ofício” afirmam que a expressão se deve a um antigo costume de branquear as folhas de ofícios com pó de tutano.

Como diria Macunaíma: “Jacaré acreditou? — nem eu”. Já dizia minha avó que “o seguro morreu de velho”, que “gato escaldado tem medo de água fria”. Ah, sim ela também dizia "se joãzinho pular da ponte, você também vai pular?", mas acho que até a avó do Noé já dizia isso.


É preciso ter “tutano” para ser tradutor e que eu saiba o tutano é usado em cosméticos por suas propriedades restauradoras e hidratantes ou, ainda, na culinária. Mas esse negócio de pó de tutano usado como alvejante, cheira a lenda urbana. Não encontrei nenhuma fonte confiável que confirmasse a informação.


É bem mais provável que a expressão se deva às qualidades evidentes do osso — algo duro de roer — que a outra explicação mirabolante. Resumindo: “ossos do ofício” são as dificuldades e empecilhos encontrados na profissão.





Mas deixando de lenga-lenga, você já parou para pensar nos ossos do ofício do tradutor?



Para mim, um dos ossos do ofício é exatamente essa mania de querer esquadrinhar tudo, cada expressão, cada palavra, como um taxidermista que vai examinando, cortando, extirpando, reconstruindo e costurando sua “peça”. Só que, diferente do taxidermista que lida com cadáveres que não reclamam da intromissão, o tradutor lida com algo vivo e rebelde: as palavras. E haja fôlego para lidar com elas, as palavras não são submissas: a última palavra é delas! (redundância total).

Agora, responda às seguintes perguntas:

Você fica pensando na origem de palavras e expressões?


Você revisa minuciosamente seus e-mails antes de enviá-los? 

Corre para o dicionário quando se depara com palavras como “inconsútil” ou “cerúleo”?


Sente calafrios na espinha quando houve coisas do tipo “tinha trago”, “tinha chego”, “estarei retornando sua ligação”, “para mim fazer”, “fazem duas semanas”, “haviam muitas pessoas”? 

Seus olhos brilham ao ouvir expressões idiomáticas? 

Prefere ganhar um dicionário a um perfume? 

Sonha que está traduzindo? 

Suas mãos tremem quando fica muito tempo longe do teclado? 

Seu sonho de consumo é aprender outra língua? 

Gosta de inventar palavras?



Se você respondeu “sim” a mais da metade das perguntas, você é um “tradutófilo” inveterado (acabei de inventar essa palavra, o sufixo “philos” vem do grego e significa “amigo”, ou seja, um aficionado à tradução) e se respondeu “não” a todas as perguntas: nossa! você é mais frio que o Dr. House!



Ah, sim, não poderia encerrar sem dizer que a tradução de “ossos do ofício” ao espanhol é “gajes del oficio”. 

E em sua opinião, quais são os "ossos do ofício" do tradutor?



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