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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Tradução e cultura

A linguagem e as palavras são fruto de uma convenção social, isto é, teoricamente a palavra é a representação de uma ideia, entretanto, a maior parte das palavras é uma escolha arbitrária em que não encontramos uma relação entre a palavra e o sentido a que ela nos remete. Por exemplo: porque dizemos cadeira, em lugar de sentadeira, ou faca, em lugar de cortador ou cortadora, ou lápis, em lugar de escrevedor?

Outro fato da linguagem é que a representação mental que fazemos de uma palavra é diferente para cada falante ou usuário, isto é, a minha imagem mental da palavra árvore é diferente da sua, isso porque a nossa “bagagem” cognitiva, as nossas experiências pessoais são diferentes. E isso também ocorre nos diferentes idiomas, a imagem e o significado da palavra “água”, por exemplo, tem valores distintos para povos e culturas em que a água é abundante e outros em que a água é escassa, ou a palavra “vaca”, que para algumas culturas evoca a representação mental de um espeto suculento girando na brasa e para outras culturas evoca o sagrado, o espiritual.

Cada comunidade linguística vive em um mundo que se diferencia de algum modo de outras comunidades, essas distinções são expressas tanto por meio da cultura quanto por meio da língua, maior responsável por revelá-las e conservá-las. A língua revela a cultura, o modo de viver, o modo de pensar e as características de seus usuários.

Uma palavra carrega significados e sentimentos inerentes à cultura da comunidade linguística que a utiliza, portanto, no momento de traduzi-la para outro idioma, o tradutor deve considerar a utilização dessa palavra na língua de origem a partir de contextos adequados para tentar reproduzir esse significado para a língua de chegada.

A imaginação do tradutor é poderosa nesse processo de criar associações, claro que essas associações podem ser distorcidas e até mesmo engraçadas em alguns casos.

Por exemplo, a palavra “palito”, que em português corresponde ao objeto utilizado para cutucar os resíduos que ficam entre os dentes após as refeições, evoca a imagem daquele palito delicado e daquela moça sorridente de franja chamada Gina que aparece na caixinha.



A palavra “palillo” em espanhol, não evoca uma imagem diferente da anterior, porém, a outra opção em espanhol “escarbadientes”, remete a uma espécie de britadeira de alto impacto capaz de “escarbar” as presas de um mamute.

A palavra “calcinha”, em português brasileiro, é uma peça que remete à economia de pano, já na Espanha o termo “braga” dá a impressão de uma peça maior; já “bombacha” palavra usada na Argentina e Uruguay remete a uma peça bem maior… e em Portugal, a peça íntima feminina chama-se cueca, assim fica difícil imaginar algo feminino, já que no Brasil esse é o nome da peça íntima masculina.

A parte do telefone que aproximamos ao rosto para falar no Brasil chama-se monofone; na Espanha, auricular; e em Portugal, auscultador, esta palavra me leva a imaginar um daqueles antigos telefones de parede.

Até a linguagem metafórica é diferente de uma cultura para outra, em português quando uma pessoa é muito grudenta e insistente dizemos que é um “carrapato”; na España chamamos essa pessoa de “lapa” que nada mais é do que aquele peixe que fica grudado ao tubarão: a rêmora.

Até mesmo a linguagem gestual é diferente de uma cultura para outra. No Brasil, o gesto de encostar a ponta do polegar na ponta do indicador, formando um círculo é um gesto obsceno, enquanto que nos Estados Unidos, significa que está tudo certo, positivo. O gesto de balançar a cabeça lateralmente, de um lado para outro, em quase todos os países do ocidente significa “não”, enquanto em outros países como Índia e Bulgária, esse gesto significa “sim” e, ao contrário do Brasil, balançar a cabeça de cima para baixo significa “não”.

No Brasil, quando alguém é inoportuno o mandamos “catar coquinhos”; na Espanha o mandamos “a freir espárragos” ou “a freir churros”. No Brasil, quando algo vende muito, diz-se que “vende como bananas”; na Espanha, que “vende como churros”.

No Brasil, uma pessoa bonita é um “gato” ou uma “gata”, na Espanha se diz “que está como um tren” e no Paraguay, Uruguay e Argentina se diz que é um “churro” ou uma “churra”

Em Portugal a palavra “borracho” designa uma pessoa fisicamente atraente, tem relação com pombo jovem que também se chama “borracho”, por outro lado, em espanhol um “borracho” é um bêbado.

É isso aí, na hora de traduzir é fundamental considerar o contexto da cultura de origem e o da cultura de chegada!

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